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sábado, 6 de maio de 2017

Globalizacao micro e antiglobalizacao macro: minha palestra na UDF

Não exatamente um artigo, apenas notas para uma palestra feita em Brasília, na última quarta-feira, como registrado e transcrito abaixo: 

“A globalização micro e a antiglobalização macro: contentes e descontentes com um processo indomável”, Brasília, 1 maio 2017, 3 p. Notas para palestra na Semana de Relações Internacionais da UDF, sobre o tema das “Relações Econômicas Internacionais e Negócios Internacionais: perspectivas e reflexões sobre uma nova configuração mundial”, no dia 3 de maio de 2017, entre 19h30 e 21h00 no Auditório do Ed. Sede do UDF; a convite do coordenador do curso de graduação em Relações Internacionais, Professor Carlos Nogueira. 
Paulo Roberto de Almeida 


A globalização micro e a antiglobalização macro:
contentes e descontentes com um processo indomável

Paulo Roberto de Almeida
 [Notas para palestra na Semana de Relações Internacionais da UDF, sobre o tema das “Relações Econômicas Internacionais e Negócios Internacionais: perspectivas e reflexões sobre uma nova configuração mundial”, no dia 3 de maio de 2017, entre 19h30 e 21h00 no Auditório do Ed. Sede do UDF; a convite do Prof. Carlos Nogueira.]

Não pretendo fazer uma exposição ex-cathedra. Vou apenas enunciar algumas notas, talvez provocadoras, mas que expressam meu posicionamento contrarianista a muito do que vai pela academia brasileira sobre os temas da globalização e seus efeitos sobre os países e sociedades, e talvez até muito do que vai pelos governos nacionais em diferentes partes do mundo, inclusive, e muito provavelmente, o que vai pelo próprio governo brasileiro sobre os temas desta semana. Não sou exatamente um antagonista, mas sou um contrarianista, ou seja, exercendo um ceticismo sadio sobre tudo.

1) Os cães ladram, mas a globalização passa...
Inanidade das críticas, por parte de sociólogos e outros antiglobalizadores, contra esse processo impessoal, incontrolado e incontrolável. Os fatos falam por si...

2) A globalização que conta é a globalização micro, não detectável pelos governos.
Ela se passa ao nível das empresas e dos indivíduos, milhares de pessoas, de pequenas, grandes e médias empresas, que agem de forma absolutamente autônoma, independente, imprevisível.

3) A globalização macro é tentativamente controlada por governos estúpidos.
Políticos, tecnocratas nacionais e de organismos governamentais tentam exercer um direito normativo sobre a globalização, atrapalhando seu caminho imprevisível.

4) Globalização assimétrica? Sim, como o mundo, o comércio, as relações sociais.
Por assimetria, os críticos ou descontentes com a globalização, querem dizer que o processo é desigual, desequilibrado, distribuindo benefícios e prejuízos de forma não controlada, causando perdas setoriais, temporárias.

5) A globalização é perversa? Absolutamente não: ela não tem nenhum foco moral.
Nada, absolutamente nada do que é feito pela e na globalização visa prejudicar grupos ou sociedades nacionais. Tudo sempre foi concebido, feito, implementado para beneficiar trabalhadores, sempre visando substituir trabalho manual, ou penoso, pela automatização, mecanização, redução de tarefas e atividades exercidas diretamente por trabalhadores, ou executivos. Continuará assim, a despeito dos latidos dos descontentes.

6) Vivemos uma desglobalização? Provavelmente não; apenas mais alguns latidos...
Alguns consideram que a fase atual, pós-Grande Recessão, seria a de certo refluxo na globalização, com a emergência ou reforço de tendências nacionalistas e protecionistas. É um fato que vários novos líderes políticos, demagogos e oportunistas, insistem na introversão como resposta a desafios colocados pela globalização, enquanto outros recorrem ao populismo econômico para compensar efeitos setoriais adversos.

7) Os governos nacionais vão perder soberania? Ótimo, eis uma excelente notícia.
Westfália representou um pequeno progresso para a humanidade: o mútuo reconhecimento recíproco de governos exercendo uma jurisdição legítima sobre um determinado território, desde que pacificado e respeitando regras mínimas de convivência internacional. Viena (1815) avançou um pouco mais na normalização das relações entre Estados soberanos, codificando o envio de representantes pessoais dos chefes de Estado ou governo para a solução pacífica das controvérsias. Versalhes (1919) avançou um pouco mais, tentando construir uma estrutura multilateral para regular essas relações, criando algumas barreiras ao surgimento de conflitos, mas infelizmente falhou. São Francisco (1945) introduziu novos constrangimentos, mas como Versalhes deixou um sistema oligárquico dividindo o mundo entre “iguais” e “mais iguais”, o que não é uma garantia de resolução de conflitos, sobretudo porque não há um entendimento consensual em torno de valores e princípios que possam unir as grandes soberanias, que deveriam ser os da democracia e dos direitos humanos, o que implica, igualmente, as mais amplas liberdades econômicas, o único regime social compatível com a globalização. Este processo, no entanto, é o que destrói progressivamente as soberanias nacionais. Isso é uma ótima coisa, pois são os governos, como já dito, que tentam barrar a globalização, e são alguns governos aqueles que perpetram violações aos direitos humanos e deformam a qualidade da democracia.

8) A reciprocidade, nas relações econômicas internacionais, é boa coisa? Depende.
Países em desenvolvimento já defenderam, com vigor, como ainda defendem, a não reciprocidade, desde que seja para diferenciar países desenvolvidos e países em desenvolvimento, o que é uma grande ilusão. Outros defendem a reciprocidade nos acordos comerciais internacionais, o que pode ser uma outra grande ilusão. Cabe examinar o assunto com base em dados verificáveis, não em suposições teóricas.

9) O protecionismo é um mal. A liberalização unilateral é o melhor caminho.
Todo economista sensato seria, ou deveria ser, contra o protecionismo e a favor do livre comércio. Políticos sensatos dizem concordar, mas na prática a teoria é outra. Mas mesmo economistas sensatos consideram que se deve “negociar” a abertura econômica e exigir compensações para a liberalização comercial, o que demonstra apenas incompreensão quanto aos efeitos do livre comércio sobre os povos. A proteção é sempre feita contra os seus próprios nacionais, em prejuízo dos consumidores e dos produtores nacionais, convertidos em avestruzes condenados à extinção.

10) Como o Brasil se situa nos processos de globalização e de liberalização?
Mal, muito mal. O Brasil é um país que se descolou do mundo, e que insiste em continuar descolado. Pequenos períodos de abertura sempre foram combatidos por novos movimentos em favor do retraimento, da introversão, da defesa e da proteção. O Brasil é um país totalmente preparado para não aproveitar nada, ou quase nada, dos grandes fluxos e intercâmbios que integram a economia global, pois dela está destacado desde muitos anos, apenas recebendo efeitos secundários e limitados, sempre trazidos por indivíduos e empresas, não pelos governos ou establishment político, ou até pelos acadêmicos (que conseguiram colocar na Constituição de 1988 a proibição de se contratar professores estrangeiros para as universidades brasileiras, o que é de uma estupidez monumental).

Voilà, creio que já temos material suficiente para discussão...

Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 1 de maio de 2017.

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