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sábado, 13 de abril de 2024

A busca por um navio negreiro no Brasil em 1852 - Terrence McCoy, Sammy Westfall The Washington Post

 

Today's WorldView

O Brasil e o seu processo de desenvolvimento - Paulo Roberto de Almeida

 O Brasil e o seu processo de desenvolvimento 

Paulo Roberto de Almeida, diplomata, professor.

Ensaio composto dos trabalhos 4509 e 4510, Por que o Brasil ainda não é um país desenvolvido?” 1 e 2 (de 13 de novembro de 2023), e dos trabalhos 4594 e 4595, “O que falta ao Brasil para ser um país desenvolvido?”, 1 e 2 (de 7 de março de 2024), da série “Brasil em desenvolvimento”, nunca divulgados integralmente, agora reunidos num único arquivo. 

  

Por que o Brasil ainda não é um país desenvolvido? (1)

 

Paulo Roberto de Almeida

Brasília, 4509: 13 de novembro de 2023


Por que o Brasil ainda não é um país desenvolvido? (2)

 

Paulo Roberto de Almeida

Brasília, 4510: 13 de novembro de 2023

 

O que falta ao Brasil para ser um país desenvolvido? (1)

 

Paulo Roberto de Almeida

Brasília, 4594: 7 de março de 2024.

 

O que falta ao Brasil para ser um país desenvolvido? (2) 

 

Paulo Roberto de Almeida

Brasília, 4595: 7 de março de 2024

 


Ler a íntegra do ensaio neste link da plataforma Academia.edu: 

https://www.academia.edu/117449322/4629_O_Brasil_e_o_seu_processo_de_desenvolvimento_2023_2024_


O Brasil e sua identidade ocidental - Paulo Roberto de Almeida

 O Brasil e sua identidade ocidental


Paulo Roberto de Almeida, diplomata, professor.

As respostas consignadas nas cinco questões apresentadas a seguir foram feitas para atender a consulta formulada por doutorando em relações internacionais, e encaminhadas previamente a longa entrevista online efetuada sobre a questão em janeiro de 2024 (não disponível). Como os argumentos podem apresentar algum interesse para outros estudantes, ou para o debate geral em torno do assunto, permito-me torná-los públicos.

Brasília, 13 de abril de 2024. 

 

1. Sabe-se que as identidades dos Estados são construídas por meio de um processo ativo e elaborado que envolve múltiplos agentes. Na sua opinião, quais são os papéis desempenhados pelo Ministério das Relações Exteriores (Itamaraty) e pela diplomacia presidencial na formulação da identidade internacional contemporânea do Brasil? 

PRA: Trata-se de um complexo processo de construção da identidade nacional brasileira que se desenvolveu ao longo de mais de um século, precedendo inclusive a própria aquisição da autonomia política nacional. A diferenciação de percepções sobre suas próprias identidades entre os colonizadores portugueses e os naturais do Brasil foi sendo acumulada desde o século XVIII, quando a produção de metais e pedras preciosas a partir do território brasileiro – nomeadamente ouro e diamantes das “minas gerais” – entrou em decadência e o sentimento de “extorsão” e de “espoliação” dos agentes da Coroa portuguesa se fez de forma mais perceptível, gerando a chamada “inconfidência mineira”, ou seja, a proclamação da independência do território das minas. Isso se estendeu até com a vinda da Família Real portuguesa ao Brasil, em 1808, e resultou na primeira revolta independentista, a revolução de 1817 em Pernambuco, de breve duração: a repressão portuguesa foi especialmente brutal. 

A Revolução do Porto, em 1820 e a necessidade de a principal colônia portuguesa se fazer representar nas Cortes de Lisboa representaram um passo decisivo na construção dessa identidade nacional, pois os trabalhos da constituinte revelaram de pronto contradições entre as aspirações dos brasileiros e o desejo lusitano de reverter o então Reino Unido ao de Portugal à antiga situação de colônia. Deputados das províncias do Brasil – mais do Sul do que do Norte e Nordeste – romperam com o texto da primeira Constituição do reino de Portugal, retornaram clandestinamente ao Brasil e passaram a lutar pela sua independência.

Não se pode falar, obviamente, de diplomacia presidencial na época da autonomia nacional, mas a diplomacia, sim, foi essencial em forjar essa nova identidade, como revelado no livro do embaixador Rubens Ricupero, A Diplomacia na Construção do Brasil, 1750-2016 (Rio de Janeiro: Versal, 2017), e assim continuou durante todo o Império e mais além. Essa identidade foi forjada nas negociações de fronteiras e nas disputas com os vizinhos do Prata, ainda que a defesa do tráfico e da própria escravidão tenha caracterizado igualmente uma parte dessa identidade, mesmo não reconhecida. No período contemporâneo, esse processo vem sendo reforçado via múltiplos canais, mas é óbvio que a diplomacia presidencial desempenhou um papel mais ativo desde a era Vargas (1930-1945 e depois 1951-54). O Itamaraty encarnou como poucas instituições nacionais essa pretensão de representar o Brasil como possuindo plena autonomia em sua projeção externa, o que é uma combinação de fatores ideológicos, instrumentais e conceituais. Mas não se pode dividir claramente o papel de um ou outro “personagem” na construção dessa identidade, uma vez que o Brasil não é uniforme nesse tipo de percepção, dependendo do governo, das personalidades que detêm o poder alternadamente e também porque o Itamaraty se mostra claramente submisso ao poder político em cada governo.

 

2. Historicamente, o conceito de Ocidente é um elemento de continuidade na estrutura identitária brasileira. No entanto, hoje o país possui uma relutância em se posicionar quer como totalmente integrado no ‘Ocidente’, quer completamente separado do ‘Ocidente’. Sendo assim, na sua opinião, como o Brasil manifestou sua identidade Ocidental na política externa dos governos petistas de Lula da Silva e Dilma Rousseff?

PRA: Essa noção de “Ocidente” é criada de forma mais consistente na Guerra Fria, quando havia uma clara bipartição do poder entre os dois grandes impérios remanescentes da Segunda Guerra Mundial. Anteriormente, a noção era mais cultural ou baseada nos valores do cristianismo e da identificação com o mundo europeu e, logo em seguida, americano. Durante a fase mais aguda da Guerra Fria, nos anos 1950-60, o Brasil se definia claramente como pertencente ao “mundo ocidental”, dado o papel central do anticomunismo na política brasileira desde pelos menos o entre guerras. Mas, ainda sob a ditadura militar, e muito por obra da diplomacia profissional, essa noção de Ocidente foi se diluindo no projeto mais amplo de construção de uma identidade própria do Brasil, como pertencente ao mundo em desenvolvimento e, portanto, menos restrito a identidades ideológicas e mais focado nos interesses econômicos e tecnológicos de uma fase de grande crescimento da capacidade produtiva nacional. O Itamaraty acompanhou, e de certa forma participou ativamente, desse processo de construção de uma nova identidade nacional, mais instrumental do que conceitual ou ideológica. 

Mas cabe registrar que o “anti-ocidentalismo”, não explícito ao início, mas presente doravante, se forja a partir do fortalecimento das forças de esquerda, socialistas e antiamericanas, nos anos 1970 e concretamente, explicitamente, desde a assunção ao poder do PT e seus aliados na mesma franja de opinião. Existe, a partir de então, governos Lula e Dilma (2003-2016) e ainda mais forte sob Lula 3, essa rejeição do Ocidente, por velhos e novos motivos, entre eles a noção de que o Ocidente está decadente e que novas forças estão emergindo no mundo. O que era antes puro resquício do antiamericanismo tradicional dos esquerdistas dos anos 1960 tornou-se, desde o surgimento do BRIC – depois BRICS e agora BRICS+ – uma clara orientação antiamericana e antiocidental. Trata-se, portanto, de uma postura explicitamente antiocidental, por motivos claramente ideológicos, uma vez que não se sabe ao certo quais vantagens poderiam trazer essas novas alianças, no confronto com o tradicional relacionamento com os países “ocidentais”.

 

3. Como o Brasil manifestou sua identidade Ocidental na política externa do governo de Jair Bolsonaro?

PRA: O governo Bolsonaro não pode ser considerado como parâmetro para qualquer avaliação da postura política-ideológica na política externa, pois tratou-se de um amálgama de ignorância com velhos preconceitos ultrapassados até na direita anticomunista dos meios militares. Ocorreu uma adesão acrítica dos novos donos do poder – de nenhuma maneira da diplomacia profissional –à visão do mundo da direita americana e, mais irracional ainda, à postura do seu líder Donald Trump. Não se pode, portanto, falar de Brasil ou de identidade nacional nesse caso, e sim de impulso desconectado de qualquer movimento real na sociedade em favor de um dos supostos polos de poder, mais por anticomunismo primário do que por uma reflexão ponderada sobre os interesses reais do Brasil (comércio com a China, por exemplo, nosso principal parceiro comercial e sustentáculo dos superávits absolutamente necessários ao equilíbrio das transações correntes). 

Não existe uma identidade Ocidental nessa política externa por não corresponder a um novo alinhamento da sociedade, muito menos ainda do Itamaraty, com novos ou velhos parâmetros de alianças externas. Tudo era proclamação sem qualquer racionalidade instrumental, e sem suporte no establishment diplomático profissional. 

 

4. Sabendo que o Brasil possui hoje uma identidade internacional multifacetada, de que forma, na sua opinião, a incorporação da identidade de ‘país em desenvolvimento’ e de ‘potência emergente’ afetou a identidade ocidental do Brasil? 

PRA: A noção de “país em desenvolvimento” está plenamente incorporada ao ethos diplomático e integrada nas posturas adotadas nos foros internacionais. A noção de “potência emergente” é mais o produto de analistas externos, dos meios jornalísticos ou acadêmicos, do que própria à “ideologia” do Itamaraty. Não se pode dizer que essas noções tenham afetado uma suposta “identidade ocidental” do Brasil, pois que essa identidade depende dos governos que ocupam o poder. Com exceção do esquerdismo do PT, nenhum dos governos de centro rejeitaram essa noção, mas ela não ocupa um lugar central nas concepções feitas sobre o país pela diplomacia ou pela opinião pública bem-informada do Brasil. Todos admitem nossa formação e cultura ocidentais, mas a noção de país em desenvolvimento, que pretende dotar-se de uma capacitação moderna nos terrenos econômico e tecnológico, é bem mais presente na imagem que a sociedade se faz de si mesma.

 

5. Na sua opinião, houve, em algum momento da história recente do país, uma ruptura, isto é, uma mudança significativa, na forma em que o Ocidente era percebido pela política externa brasileira?

PRA: Sim, ocorreu, e de forma explícita desde os primeiros governos do PT e de forma mais acentuada neste terceiro mandato de Lula, talvez por excesso de confiança de que possa surgir uma “nova ordem global” não comandada, não controlada ou não tutelada pelos Estados Unidos, mas isso é apenas a expressão de um anti-imperialismo anacrônico e enviesado – válido apenas contra os EUA – e de um antiamericanismo vulgar. O governo de Lula 3 é claramente antiocidental, mais por falta de uma reflexão adequada sobre a questão do que por alguma teoria conspiratória ao estilo da que existia sob o bolsolavismo diplomático esquizofrênico da gestão anterior. No governo Bolsonaro, assessores amadores, ignorantes em política internacional, seguiam as correntes da franja lunática existente sobretudo nos Estados Unidos caracterizada pelo antiglobalismo e antimultilateralismo, uma verdadeira aberração do ponto de vista da diplomacia profissional. Aquilo, sim, foi uma ruptura com padrões tradicionais da diplomacia brasileira. A ruptura atual é basicamente uma ignorância da esquerda rústica com respeito ao que significa o Ocidente para o Brasil e para suas oportunidades de desenvolvimento econômico e social no contexto de uma democracia de mercado, associada às liberdades iluministas da tradição ocidental. O anti-ocidentalismo petista é bem mais o reflexo de seu antiamericanismo anacrônico (e claramente contrário aos interesses nacionais do Brasil); alegoricamente, seria uma espécie de “doença de pele”, que vai passar, assim que pessoas mais esclarecidas dirigirem o país e a sua diplomacia.

 

Paulo Roberto de Almeida

Brasília, 4566, 22 janeiro 2024, 4 p.; revisão: 13/04/2024

 

Também disponível neste link da plataforma Academia.edu: https://www.academia.edu/117446360/4566_O_Brasil_e_sua_identidade_ocidental_2024_

O Brasil, com déficit fiscal nominal de 9,24% do PIB destina 43,46% da carga tributária para 6,34% da população - Ricardo Bergamini

 O Brasil, com déficit fiscal nominal de 9,24% do PIB destina 43,46% da carga tributária para 6,34% da população. 

No serviço público existe o crescimento vegetativo dos gastos com pessoal, assim sendo mesmo sem qualquer interferência do governante de plantão, os gastos com pessoal crescem com benefícios imorais existentes (promoções automáticas, quinquênios, licença prêmio, dentre centenas de outras aberrações ainda existentes no Brasil). 

 

Um grupo de trabalhadores de primeira classe (servidores públicos) composto por 13,5 milhões de brasileiros (ativos, inativos, civis e militares) que representam apenas 6,34% da população brasileira, sendo 2,2 milhões federais, 4,9 milhões estaduais e 6,4 milhões de municipais custaram R$ 1.453,5 bilhões em 2022, correspondentes a 14,66% do PIB. Esse percentual representou 43,46% da carga tributária que foi de 33,71% do PIB em 2022. 

 

No acumulado em doze meses até dezembro de 2022, o déficit fiscal nominal alcançou R$ 460,4 bilhões (4,68% do PIB). No acumulado em doze meses até fevereiro de 2024, o déficit fiscal nominal alcançou R$ 1.015,1 bilhões (9,24% do PIB). Aumento real em relação ao PIB de 97,44%, comparativamente ao acumulado em doze meses até dezembro de 2022.

 

Até quando a masturbação mental ideológica “esquerda-direita” vai continuar destruindo o Brasil? 

Ricardo Bergamini


Ministra diz que governo estuda reajuste a servidores acima de 19% até 2026

 

Prioridade para este ano são os técnicos da educação. Aumento pode beneficiar cerca de 200 mil funcionários da área

 

Agência o Globo

 

Publicado em 11 de abril de 2024

 

A ministra da Gestão e Inovação, Esther Dweck, disse nesta quinta-feira que o governo está estudando um reajuste salarial dos servidores acima de 19% até 2026. No momento, a prioridade para negociações são os técnicos de instituições federais, que mobilizam greves pelas universidades no país.

 

Matéria completa clique abaixo:

 

https://exame.com/economia/ministra-diz-que-governo-estuda-reajuste-a-servidores-acima-de-19-ate-2026/

 


terça-feira, 9 de abril de 2024

O Brasil tem problemas demais para ter pensamento estratégico- Rubens Barbosa (OESP)

AMBIÇÃO EXTERNA SEM PENSAMENTO ESTRATÉGICO

Rubens Barbosa

O Estado de S. Paulo, 9/04/2024


No Brasil, os problemas sociais, pobreza, concentração de renda, falta de recursos para o Estado, gastos desnecessários e duplicados, déficit público, déficit educacional e cientifico e tecnológico, sem falar nos privilégios, nos problemas da segurança pública, na violência e na corrupção, segurança jurídica para garantir investimentos, para citar os mais dramáticos, deixam pouco espaço para um pensamento de meio e longo prazo, verdadeiro esforço estratégico para um país do porte do Brasil, potência média, a nona economia do mundo, com interesses importantes a preservar na área do agronegócio e com grandes deficiências e vulnerabilidades na área industrial e, sobretudo, de Defesa, pelo baixo aproveitamento dos avanços da tecnologia.

 

O mundo mudou e hoje as preocupações com a Defesa são prioritárias. No meio de duas guerras, na Europa e no Oriente Médio, 58 conflitos localizados em 35 países e, na nossa vizinhança, a ameaça bélica da Venezuela contra a Guiana, o Brasil não pode se dar ao luxo de ignorar esse pensamento estratégico.

 

A falta de uma visão estratégica tornou-se trágica para o ambiente da Defesa Nacional e para um projeto nacional, exemplificado agora com o anúncio da venda da AVIBRAS, empresa líder de tecnologia de ponta no lançamento de foguetes. Com problemas de gestão que se arrastam a mais de ano, com dívidas acumuladas, o governo Lula ao assumir, tentou encontrar uma fórmula para preservar a empresa nacional, sem sucesso.

 

Caso se concretize a venda da AVIBRAS, será a terceira empresa de grande porte e significado na Defesa que o Brasil perde, depois da Engesa (carro de combate) e da Mectron SIATT (míssil naval). Em comunicado, a Avibras e a empresa australiana Defend Tex informaram que vem mantendo tratativas para viabilizar a recuperação econômica-financeira da empresa para manter suas unidades fabris no Brasil, retomar as operações e manter o fornecimento previsto nos contratos. Apesar do grave dano à soberania, com a desnacionalização da empresa, a operação conta com a boa vontade do governo e das autoridades do Ministério da Defesa (MD), inclusive dos comandantes das três Forças.

 

O Centro de Defesa e Segurança Nacional (CEDESEN), junto com a ABIMDE, apresentaram proposta ao MD que poderia ser uma saída para a Avibras. Sugeriu-se a criação da Empresa Crítica de Defesa (ECD), visto que uma análise de risco observando impacto com a descontinuidade de operações ou com a perda do controle nacional mostra que certas empresas são Críticas para o presente e futuro da país. A proposta é simples e direta: Criação, por lei, da classificação adicional de ECD, que se somaria às Empresas Estratégicas de Defesa (EEDs) e Empresas de Defesa (EDs). Para se tornar ECD a empresa deveria ser uma EED. Uma análise de risco deveria apontar que a sua descontinuidade possuiria impacto significativo imediato e de longo prazo em áreas estratégicas e de interesse da Segurança Nacional (e não somente Defesa Nacional). O Estado deveria se organizar para realizar aquisições mínimas periódicas das ECD de forma manter a capacidade de P&D e produtiva ao menos com carga mínima, evitando-se assim a sua desmobilização. Como contrapartida, as ECD deveriam estar sujeitas a intervenção técnico-econômica direta da União em caso de iminência de perda de controle nacional ou de severo desarranjo econômico. Os mecanismos precisariam ser discutidos, mas poderiam incluir a criação de Golden Share, inclusive sendo este uma forma de aporte financeiro.

 

Segundo a legislação vigente, a lei 12.598, determina que, em EED, o controle fique restrito a 40% dos votos, além de desenvolver tecnologia nacional. Aparentemente, não foi isso o que ocorreu. A legislação deveria ser aplicada, mas pode deixar de ser por não existir um responsável por desenvolver e sustentar uma Base Industrial de Defesa estratégica para o país

 

Algumas sugestões apareceram para tentar contornar a questão das dívidas crescentes da companhia que parou de fornecer equipamento ao exterior e enfrenta ameaça de paralização total. A última instância seria estatizar a empresa em troca da dívida tributária sem colocação de recursos públicos ou controle administrativo para empresas, mas não teve apoio de Lula.

 

Essa transação ocorre quando o MD discute a atualização da Política Nacional de Defesa e a Estratégia Nacional de Defesa, embora a questão da Avibras certamente não tenha sido colocada no contexto mais amplo da capacidade de Defesa do país. Os interesses divergentes no contexto do establishment militar brasileiro não permitem ainda o entendimento de que a capacidade militar tem dois componentes essenciais. Capacidade operacional de combate, providas pelas FFAA e capacidade logística de defesa, provida pelas sinergias entre um órgão do Estado que gere a demanda por produtos e tecnologia de defesa e uma BID estratégica, sem a qual as FFAA não podem operar e mesmo existir. As FFAA exigem uma reforma estrutural para se modernizar e apoiar a indústria nacional de Defesa.

 

O assunto transcende as competências do Poder executivo e deveria merecer a atenção do Congresso já que envolve questões de Defesa e Segurança Nacional.

 

Rubens Barbosa, presidente do Centro Estudos de Defesa e Segurança Nacional (CEDESEN)


sábado, 6 de abril de 2024

Brasil evita se indispor com parceiros comerciais ao não apoiar investigações contra Irã e Rússia - Luiz Henrique Gomes (O Estado de S. Paulo)

 Brasil evita se indispor com parceiros comerciais ao não apoiar investigações contra Irã e Rússia

País se absteve de duas resoluções no Conselho de Direitos Humanos da ONU que investigam violações no Irã e na invasão russa da Ucrânia; analista diz que posição expressa perda de protagonismo da ONU

Luiz Henrique Gomes 

O Estado de S. Paulo, 05/04/2024 


A decisão do Brasil de se abster em duas resoluções do Conselho de Direitos Humanos (CDH) das Nações Unidas que investigam violações no Irã e na invasão russa da Ucrânia demonstra a prioridade do País em não se indispor com dois parceiros comerciais importantes, avalia o pesquisador e professor de relações internacionais Roberto Uebel. Segundo eles, a posição da diplomacia brasileira também expressa uma perda de protagonismo da ONU como espaço para se resolver questões internacionais.

Aprovadas por maioria de votos, as resoluções estendem duas investigações da ONU de violações de direitos humanos causadas pelos governos de Teerã e Moscou, parceiros comerciais do Brasil no Brics. Outros membros do bloco, como aÁfrica do Sul, Índia e Emirados Árabes Unidos (no caso do Irã) também se abstiveram. A China foi mais enfática e votou contra os dois documentos.

Para Roberto Uebel, pesquisador e professor de relações internacionais da ESPM, a posição do Brasil nas duas questões demonstra uma tentativa do País construir um pragmatismo na relação às duas nações. “Mostra que o País não quer se indispor, para não causar um distanciamento de dois parceiros comerciais importantes”, disse.

No caso do Irã, o CDH investiga violações cometidas contra mulheres, crianças e minorias étnicas e religiosas depois da morte da jovem Mahsa Amini em 2022. O embaixador brasileiro na ONU, Tovar da Silva Nunes, reconheceu e criticou as violações, mas expressou confiança de que Teerã vai “fortalecer os esforços para melhorar a situação” e se absteve com base “no diálogo construtivo”.

“Encorajamos o Irã a seguir aumentando seu envolvimento com mecanismos de direitos humanos num espírito de cooperação e abertura”, declarou Nunes.

De acordo com Uebel, o discurso do embaixador brasileiro expressa um “apoio crítico”, mas mal calculado. “A fala do representante brasileiro enfatiza que o Brasil condena qualquer violação de direitos de mulheres, mas o País prefere a abstenção por acreditar que o Irã vai cooperar nessa matéria. É um cálculo político que eu avalio como equivocado. O Irã dificilmente irá repensar essas práticas”, afirmou.

Com relação à resolução que investiga as práticas da Rússia na Ucrânia, o representante brasileiro em Genebra também reconheceu a existência de violações, mas classificou o texto de “desequilibrado” e disse que poderia impedir o diálogo entre os dois lados em guerra.

“Permanecemos descontentes com o texto diante de nós. A resolução é desequilibrada e coloca o fardo das violações dos direitos humanos apenas em um lado do conflito, não deixando espaço suficiente para o diálogo que poderia criar condições para prevenir violações de direitos humanos e construir uma paz duradoura na região”, afirmou o chefe da missão brasileira em Genebra.

Uebel avalia que neste caso o posicionamento brasileiro expressa tanto o pragmatismo com a Rússia quanto envia uma mensagem crítica à Kiev. “É um recado para que a Ucrânia também dialogue para a guerra chegar ao fim”, disse. “Neste caso, o Brasil está esgotado com essa questão. Desde o início, a diplomacia brasileira preza pelo diálogo, e inclusive já se colocou à disposição para mediar, mas hoje entende que a Ucrânia precisa estar disposta a esse diálogo, e ela não está por suas questões territoriais”, avaliou.


Perda de protagonismo da ONU

As abstenções no CDH também exprimem uma perda do protagonismo da ONU como fórum multilateral, afirma o analista. Com o surgimento do Brics e do G-20, por exemplo, o Brasil passa a acreditar – como externou o embaixador brasileiro na resolução do Irã – no diálogo em outras instâncias além das Nações Unidas.

A ONU tem sido ineficaz para a resolução de conflitos, a exemplo da Ucrânia e da guerra de Israel contra o Hamas, o que também contribui para esse movimento.

Segundo Uebel, o descumprimento de resoluções da ONU externam um enfraquecimento dos Estados no papel das relações internacionais. “Você tem outros atores, que são empresas, bancos internacionais, sociedade civil, que estão discutindo e podem ter peso nestas questões”, disse. “Se você quer construir uma relação internacional forte, é preciso ter reformas e o engajamento maior desses outros atores em questões relativas aos direitos humanos, por exemplo.”